quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Professores de Filosofia e Sociologia do RJ se manifestam contra a redução de aulas de suas disciplinas.

Carta-Consulta ao Conselho Nacional de Educação 

Assunto: Carga horária semanal das disciplinas Sociologia e Filosofia, em atenção ao cumprimento da Lei nº 11.684/2008. 


Ao Ilmo. Sr. Presidente da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação 


Nós, abaixo-assinados, docentes de Filosofia e Sociologia que lecionamos na Educação Básica, apoiados pelas entidades que subscrevem conosco esta Carta, deliberamos coletivamente, em reunião realizada na cidade do Rio de Janeiro, em 09 de dezembro de 2011, pela apresentação desta Consulta ao Conselho Nacional de Educação, em caráter de urgência, tendo em vista as questões apontadas a seguir. 

A Secretaria Estadual de Educação do Rio de Janeiro – SEEDUC/RJ publicou no seu Diário Oficial, em 01 de dezembro de 2011, a redução da carga horária das disciplinas Filosofia e Sociologia nas matrizes curriculares que entrarão em vigor no ano letivo de 2012, estabelecendo a oferta de apenas um tempo semanal de aula nas duas primeiras séries do ensino médio regular e em todas as séries do EJA. 

Temos conhecimento de que tal medida não se configura como uma ação isolada por parte da SEEDUC/RJ, pois outras redes de ensino, públicas e privadas, em todo o país, em resposta à obrigatoriedade determinada pela Lei nº 11.684/2008, têm apresentado configurações semelhantes na formatação das suas matrizes curriculares. No caso das escolas privadas, temos notícias, inclusive, do não cumprimento da Lei citada, com as disciplinas de Filosofia e Sociologia sendo substituídas por outras de caráter genérico, que não mantêm qualquer relação com os conteúdos oferecidos por essas disciplinas, assim como, consequentemente, não garantem a contratação de docentes com formação qualificada.

Nós, docentes de Filosofia e Sociologia, temos clareza de que esse egrégio Conselho, por intermédio da sua Câmara de Educação Básica, já normatizou a oferta das referidas disciplinas, através dos Pareceres CNE/CEB nº 38/2006 e nº 22/2008. Neste último documento, aprovado pelos conselheiros por unanimidade, em 08 de outubro de 2008, ficou determinado que:

(...) os sistemas de ensino de todos os entes federativos devem fixar normas complementares e medidas concretas para a oferta desses componentes curriculares em todos os anos de duração do Ensino Médio. Devem, ainda, zelar para que haja sua efetivação, coibindo atendimento meramente formal ou esparso e diluído, garantindo aulas suficientes para o desenvolvimento adequado de estudos e atividades desses componentes, com a designação específica de professores qualificados para tanto. (Parecer nº 22/2008, Análise do Mérito, II, p. 3. Grifos ausentes no original). 

O voto do Relator Conselheiro Cesar Callegari, reiterando o disposto acima, entre outras medidas relativas ao prazo e ao caráter de implantação obrigatória desses componentes curriculares, indicou que 

(...) as escolas têm autonomia quanto à concepção pedagógica e à formulação de sua correspondente proposta curricular, desde que garantam sua completude e coerência, devendo dar o mesmo valor e tratamento aos componentes do currículo que são obrigatórios, seja esse tratamento por disciplinas, seja por formas flexíveis, com tratamento interdisciplinar e contextualizado (Parecer nº 22/2008, II – Voto do Relator, item 3. Os grifos não constam do original). 

Em anexo ao citado Parecer, visando ao cumprimento imediato da Lei 11.684/2008, o Relator apresentou ainda o Projeto de Resolução que, em seu artigo 3º, reiterou as indicações apresentadas no documento: 

Os sistemas de ensino devem zelar para que haja eficácia na inclusão dos referidos componentes, garantindo-se, além de outras condições, aulas suficientes em cada ano e professores qualificados para o seu adequado desenvolvimento. (Parecer nº 22/2008, Projeto de Resolução, Art. 3º. Grifos ausentes no original). 

Temos pleno entendimento, portanto, que a garantia do efetivo cumprimento da Lei nº 11.684/2008, com a oferta dos componentes curriculares de Filosofia e de Sociologia nos termos apresentados pelo Parecer nº 22/2008, somente poderá ser possível com a garantia não só da presença de professores qualificados, mas de uma quantidade mínima de aulas suficientes para o desenvolvimento adequado de estudos e atividades – pré-requisito que subentende a inclusão nas matrizes curriculares de todos os sistemas de ensino de, pelo menos, a carga semanal de dois tempos consecutivos de aula. Somente dessa forma as disciplinas Filosofia e Sociologia não seriam ofertadas de forma diluída ou esparsa, tornando praticamente sem efeito os objetivos em que se basearam os legisladores quando aprovaram a referida Lei que modificou a LDB, determinando a obrigatoriedade desses componentes curriculares. 

As disciplinas de Filosofia e de Sociologia exigem tempo adequado e de qualidade para que seus benefícios possam fazer-se notar, pois não se confundem com o mero “debate sobre temas da atualidade”. Há que se trabalhar o pensamento do aluno a fim de que o mesmo apreenda o tipo de raciocínio próprio às disciplinas, pois que os seus modelos discursivos implicam na superação de uma visão naturalizante do mundo social e humano – esta, já garantida por outras disciplinas científicas. 

A implantação das disciplinas Filosofia e Sociologia em todas as escolas, privadas e públicas – inclusive às pertencentes à Rede Federal de Educação Profissional e Tecnológica –, não pode assumir um caráter “secundarizado”, ferindo o princípio da paridade de tratamento que deve ocorrer entre todas as disciplinas e contribuindo para a precarização do trabalho docente, como se percebe nos relatos de diversos professores que são obrigados a ministrar os conteúdos dessas disciplinas para adolescentes e jovens em apenas um tempo de aula, às vezes de quarenta ou quarenta e cinco minutos, dependendo da rede de ensino. Apenas Filosofia e Sociologia têm carga horária de um único tempo semanal, o que por si só caracteriza tratamento diferenciado em prejuízo das duas disciplinas. Os efeitos da redução da  carga horária que as disciplinas vêm sofrendo em diversas redes de ensino ainda se estendem e se desdobram noutras disciplinas, pois docentes são obrigados a ministrar aulas em disciplinas para as quais não foram formados, por vezes orientados pelas próprias secretarias de educação, a fim de completarem a jornada de trabalho. 

Nós, docentes de Filosofia e de Sociologia, reconhecemos a importância da Lei nº 11.684/2008, elaborada como parte de um compromisso histórico que nós, educadores, temos como essencial ao resgate da formação humanística dos nossos estudantes da Educação Básica e à qualidade da educação em nosso país. Nesse sentido, em defesa da dignidade e do aprimoramento das condições de trabalho dos docentes, como garantia da qualidade do ensino de Filosofia e de Sociologia nesta sua longa e árdua jornada de reinserção no currículo escolar, solicitamos desse Conselho, mui respeitosamente, a elaboração de novo Parecer que não permita qualquer tipo de dúvida ou interpretação a respeito da necessidade de se garantir, para a efetivação da Lei, a oferta mínima de dois tempos semanais consecutivos para as disciplinas de Filosofia e Sociologia, em todas as séries do ensino médio, em todos os sistemas de ensino. 


Atenciosamente, 


Rio de Janeiro, 01 de fevereiro de 2012 


Assinam: 



APSERJ – Associação Profissional dos Sociólogos do Estado do Rio de Janeiro 



Elinete Silva Aquino – Coordenadora 



Professora de Sociologia da SEEDUC/RJ – Secretaria Estadual de Educação. Membro da 

Comissão Pró-ABECS - Associação Brasileira de Ensino de Ciências Sociais 



SEAF – Sociedade de Estudos e Atividades Filosóficas 



Olinto Antonio Pegoraro – Presidente 



Professor de Filosofia da UERJ – Universidade do Estado do Rio de Janeiro 


SINPRO Niterói e Região – Sindicato de Professores da Rede Particular de Niterói, 


São Gonçalo, Maricá, Itaboraí e Tanguá 



Sérgio Oliveira da Silva – P/Direção Colegiada 



Professor de Filosofia da FAETEC – Fundação de Apoio à Escola Técnica do Estado do 

Rio de Janeiro, SEEDUC/RJ – Secretaria Estadual de Educação e Rede Privada de Ensino

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