Vale a pena conferir!
Pode ser um porão, uma sala de
aula, um salão de jogos ou mesmo um complexo de edifícios destinados ao serviço
social. O centro ou diretório acadêmico (apelidado de CA ou DA) é o espaço do
aluno dentro da universidade. Por isso, independentemente de a vocação do seu
CA ser engajada ou festeira, vale a pena conhecer, participar e cobrar a ação
desse valioso espaço de discussão para os estudantes.
Na Faculdade de Direito do
Largo de São Francisco, campi da USP (Universidade de São Paulo), no centro da
capital paulista, o Centro Acadêmico XI de Agosto é o lugar de manifestação
política, ação social e entretenimento dos alunos. Os 103 anos de história, a
lista de antigos membros que se tornaram grandes políticos e intelectuais (como
Jânio Quadros, Washington Luiz e Monteiro Lobato), além da acirrada disputa
política entre as chapas que concorrem pela gestão do XI mostram que, na São
Francisco, centro acadêmico é coisa séria.
"Num momento histórico em
que todas as instituições estão desacreditadas, cabe aos CAs e DAs despertar
nos calouros o interesse pela política de maneira plural, democrática e
paciente", afirma Caio Miranda Carneiro, aluno do 5º ano e presidente do
XI de Agosto na gestão atual. O quorum da última eleição de gestores do XI foi
de 1500 votantes entre os quase 2400 alunos da faculdade - um dos mais altos
índices de participação em órgãos estudantis do Brasil. Caio explica que a
postura engajada do CA não impede a organização de festas e eventos, como a
tradicional Peruada da São Francisco. "Sou defensor radical da
brincadeira. A pessoa que fizer política
na faculdade e não tiver humor está fadada a frustração", afirma Caio.
Bruno Sales, do 3o ano, conta
que se sentia pouco interessado em participar do XI devido aos conflitos entre
as chapas, que algumas vezes chegam a ser violentos. Apesar disso, resolveu
investir na organização de eventos culturais na faculdade, contando com o apoio
do centro acadêmico. Bruno é um dos coordenadores da Semana Vinícius de Moraes
encontra Guimarães Rosa, que acontecerá de 25 a 29 de setembro na São
Francisco. A estrutura física e a verba necessária para a organização inicial
do projeto, bem como a negociação com parceiros e patrocinadores, tiveram o
respaldo do XI de Agosto. O centro acadêmico da São Francisco também
possibilita que os alunos participem de iniciativas de apoio à sociedade civil,
como o Cursinho Popular e o Departamento Jurídico XI de Agosto.
Alguns centros e diretórios
acadêmicos focam sua ação em oferecer serviços aos estudantes da faculdade. O
Dafam, Diretório Acadêmico da Faculdade de Arquitetura do Mackenzie, em São
Paulo, por exemplo, abriga um espaço de convivência, uma copiadora terceirizada
e uma sala de produção de maquetes para os alunos do curso. Além disso, os
gestores do diretório acadêmico convocam assembléias extraordinárias para
discutir propostas da direção da faculdade, já que os DAs do Mackenzie têm
direito de voto no conselho administrativo.
A verba do Dafam vem da
administração do Mackenzie, a partir da aprovação dos projetos apresentados
pelo DA. Apesar disso, Samira Rodrigues, aluna do 7º semestre e tesoureira do
diretório, afirma que a independência financeira e ideológica do Dafam está
garantida por uma poupança iniciada em gestões passadas. Esse fundo nunca
precisou ser utilizado, já que não houve conflito sério de interesses entre o
diretório e a faculdade desde então. "Procuramos resolver em primeiro
lugar os problemas do nosso curso", afirma Samira. "Mas isso não
impediu o Dafam de brigar, por exemplo, para que fossem eleitos novos membros
pro DCE [Diretório Central de Estudantes, órgão estudantil máximo do Mackenzie]
depois de três anos sem eleições".
Como driblar
o desinteresse
Nem todos os centros e
diretórios acadêmicos conseguem atrair o interesse e a atuação dos alunos.
Segundo a pesquisadora de Educação Rosemary Roggero, coordenadora do Núcleo de
Apoio Acadêmico da Direção de Graduação do Centro Universitário Senac e autora
da tese Contradições Na Educação Superior "O Perfil do Jovem Contemporâneo
e O Discurso Pedagógico", a apatia do jovem pela atividade de centros e
diretórios acadêmicos é um reflexo do que acontece hoje em todos os âmbitos da
sociedade: "Ao contrário do que acontecia nas décadas de 60 e 70, o jovem
de hoje tem liberdade de discutir a sociedade na sala de aula e em diversos
outros espaços. Mas apesar de ter liberdade de reclamar, ninguém lhe oferece
uma via de atuação que realmente possa modificar a realidade".
Rosemary acredita que as
preocupações do jovem contemporâneo - que, de acordo com a sua pesquisa, são
Educação de qualidade e inserção no mercado de trabalho - têm sido pouco
abordadas por todas as instâncias da universidade, inclusive pelos centros e
diretórios acadêmicos, que muitas vezes só são atrativos como centros de
convivência. Ela defende que uma ação que vá de encontro ao novo perfil do
jovem é responsabilidade não apenas dos CAs, mas também da sociedade civil
organizada e do corpo docente. "O professor tem que rever sua capacidade
de liderança, e assim dar referências para que o jovem se interesse pela luta
por mudança".
Na Cásper Líbero, em São Paulo,
o CA Vladimir Herzog é gerido por uma chapa que foi a única concorrente da
eleição estudantil com menor número de votantes na história da Cásper - menos
de 1/5 dos 2200 alunos da faculdade. Segundo Juliana Sada, aluna do 2o ano de
Jornalismo e diretora financeira do centro acadêmico, em média apenas cinco
alunos não-participantes da gestão costumam comparecer às reuniões quinzenais
promovidas pelo CA. "Esses alunos geralmente são calouros, menos
resistentes à atuação do CA do que os veteranos da Cásper", conta Juliana.
Rodrigo Rodrigues, aluno do 4o
ano de jornalismo, participou da gestão do centro acadêmico em 2003 - na mesma
época em que uma crise institucional culminou no pedido de demissão de 17
professores da faculdade de Jornalismo, que eram apoiados pelo CA em suas
reivindicações. Segundo Rodrigo, o desgaste que a crise de 2003 provocou na
imagem do centro acadêmico ainda não foi superado pelas gestões posteriores.
Ele acredita que a precariedade da estrutura física do centro acadêmico e a
dificuldade em realizar eventos culturais e de entretenimento que atraiam os
estudantes - problema que, segundo Rodrigo, é agravado pela burocratização
imposta pela faculdade - contribui para que os alunos não encontrem incentivo e
representatividade no centro acadêmico: "A imagem de politização do CA se
deteriorou muito. Além disso, com o aumento das mensalidades [o valor que
antigamente era igual a um salário mínimo hoje chega a 915 reais], o perfil do
aluno também mudou, e é necessária uma ação do CA para reconquistar essas
pessoas".
Assim como Rodrigo, Juliana
atribui a falta de identificação dos alunos da Cásper com seu centro acadêmico
à desaprovação da atuação do CA Vladimir Herzog durante a crise de 2003.
Segundo ela, algumas iniciativas estão sendo adotadas para modificar essa
realidade, como a organização de palestras e debates (como o Ciclo de Debates
sobre Cultura Livre, que acontecerá em agosto), e a publicação de um jornal
mensal - o Do Avesso, que ainda não é muito conhecido pelos alunos da Cásper, está
em sua segunda edição, com tiragem de 1500 exemplares - para informar os alunos
sobre as atividades da gestão. "Conhecer melhor é o primeiro passo para
que os alunos comecem a gostar e a participar do centro acadêmico
ativamente", afirma Juliana.
Fonte: Portal Universia
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